sábado, 14 de janeiro de 2017

O COMEÇO DE TUDO...

NOMEAÇÃO PARA O 5.º BAIRRO FISCAL
COMO ASPIRANTE ESTAGIÁRIO



COMO ESTAVA NA TROPA, A POSSE FOI SÓ EM 31 DE DEZEMBRO DE 1976

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

SILÊNCIO QUINTOBAIRRISTA

OUÇAM O SILÊNCIO...

OUÇAM BEM...

POIS BEM, FIQUEM COM O SILÊNCIO 
QUE EU VOU CONTINUAR A G R I T A R!


DA ANTOLOGIA DE 2012


TOMEM LÁ UM CONTO:


O SONHO DE LEOCÁDIA


Conto de Luís Pessoa


Sempre que o sol rompia, esfarelando a finíssima teia nevoenta que o frio da noite tecera, a vida retomava o seu ciclo por entre algazarras juvenis e espreguiçadelas amadurecidas nos anos.
A vida familiar era assim mesmo, marcada pela sucessão do dia e da noite, pela presença e pela ausência, pela penúria e pela abundância e Leocádia sabia isso perfeitamente.

- Leocádia, todo o cuidado é pouco. Presta atenção ao que te digo…

Os alertas mil vezes repetidos, ora pelo pai, ora pela mãe, encontravam o eco que Leocádia entendia merecerem, ou seja, nenhum.

Se a vida era bela, os odores da terra e do lago, do céu e da floresta traziam no seu seio a inebriante frescura da paz, se tinha a certeza de ser aquela que os deusas escolheram para ser feliz e capaz de arrostar todas as improváveis adversidades, que razões poderiam ter os pais para tantos avisos?

E todos os dias a cena se repetia, quando eles saíam em busca do sustento de toda a família.

Leocádia brincava descuidadamente com o irmão, rebolando pela encosta, saltitando alegremente, sorvendo cada segundo, enquanto o irmão se ia revelando mais maduro, mais atento ao mundo e aos perigos que sempre rodeiam os jovens. Leonel já sentia as transformações que o seu corpo operava e as formas que a Leocádia exibia, ainda que esta não parecesse notar. A infância fora-se, de forma rápida e o mundo parecia ter mudado ao mesmo ritmo. Só os avisos dos pais se mantinham inalterados, em apelos cada vez mais insistentes para que todos os sentidos estivessem sempre no máximo de concentração.

Leonel apreendeu, Leocádia ignorou.

Um dia os pais não regressaram e Leonel anunciou que se ia embora.

Sozinha, Leocádia viu chegada a sua hora, porque nunca fora o que os pais queriam que ela fosse, porque era ela, aquela que acreditava, melhor, que sabia ser a eleita pelos deuses e que nada nem ninguém podia destruir ou sequer perturbar.

E iniciou a sua grande viagem, pela madrugada.


--o--

Sara, vivia no fausto do seu apartamento, bem no centro da cidade e de lá irradiava beleza e falta de sentido de vida. Nada nem ninguém a entusiasmava e só umas tantas jóias, vestidos sumptuosos, casacos de pele caríssimos e outros artifícios lhe despertavam, ainda, algum sentimento.

João, arquitecto de obras nunca feitas, herdeiro natural de fortunas que não conquistou, era o eleito do coração de Sara, pelo menos por agora, enquanto diamantes e riquezas brotassem das mãos bem tratadas, que nunca conheceram trabalho.

Naquele princípio de tarde, ao acordar após uma noite particularmente agitada, com baile de gala e champanhe francês em abundância, Sara ergueu os olhos ao céu do quarto e não se sentiu…

- Não sou Sara… Não sou…

Ergueu-se deslumbrante, felina, magnífica, como só as deusas sabem ser, exibindo a graça e a feminilidade dos seres abençoados, rasgando o silêncio com um suave ronronar, atravessado a espaços, por rugidos de amantes entrelaçados.

A porta abriu-se e sorrateiramente, João entrou para dar o costumado beijo à sua amada, mas não a reconheceu.
Viu Milinha, a gata de estimação em estado de choque, hipnotizada, como que em adoração a uma divindade maravilhosa, cintilante na sua auréola…

João não teve medo, não gritou, não pediu ajuda, apenas se inclinou, respeitoso, quase reverente, submerso no mar imenso de luminosidade, antes de cair de joelhos, erguendo as mãos em prece, até tocar a pelagem sedosa, brilhante, imaculada, de uma beleza que ultrapassava a imaginação.

Fora precisamente para isso que comprara aquela pele maravilhosa a um caçador furtivo, recentemente regressado de África, que lhe jurou ter visto a majestosa fêmea chorar, quando a surpreendeu, distraída…

- Não exactamente distraída, mas sonhadora! – Afirmara-lhe ele.

João vivia o sonho, finalmente, deslumbrado e manietado, balbuciando um nome que nunca ouvira:

- Leocádia!... Leocádia, meu amor!...